Por mais que me esforce, não consigo lembrar-me quais as
últimas palavras que trocámos. Talvez tenha sido apenas um sorriso triste, de
mãos entrelaçadas sobre uma cama de hospital. A doença, como um aviso prévio,
deu-nos o tempo para não deixar nada por dizer, nada por fazer. Todas as mágoas
se desvaneceram, perante a imposição de um inevitável adeus. “É agora?”. Recordo-me
de teres perguntado numa ocasião, ainda vagamente consciente, enquanto já
esperavas pela morte com a certeza serena que sempre te admirei. Sem medo,
revolta ou porquês, entregaste-te à morte como sempre te abriste à vida:
destemido! “Quando a morte nos sorrir, só temos de lhe sorrir de volta”,
repetias sempre. E assim o cumpriste. Talvez a nossa última palavra trocada
tenha sido apenas esse sorriso, aquele que farei perpetuar na memória até ao último
dos meus dias. Aquele que revejo nas molduras espalhadas pela casa com as quais
insisto em conversar, sem nunca conseguir mais do que solitários monólogos. Aquele
que, como uma réplica perfeita, diariamente resplandece no rosto de uma menina
- prova viva que um dia, entre nós, o amor existiu. Hoje cumprem-se dois anos
de eterna saudade. E eu continuo a cumprir o que te prometi. Enquanto a força
me dominar a vontade, vou continuar-te, amando pelos dois o nosso maior
tesouro.
por Cláudia Sofia Sousa
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