Avançar para o conteúdo principal

Mensagens

A mostrar mensagens de dezembro, 2013

Quilómetro zero

Fim de ciclo. Hora de despertar e renascer. Tempo de um novo recomeço. Um apelo à correcção de teimosos hábitos entranhados que nos adormecem os sentidos travando a evolução. Uma nova oportunidade de partir em busca de descobertas infinitas. As escolhas são sempre múltiplas e a aposta nem sempre certeira. A caça é tantas vezes feita de tiros ao lado. Mas perseguir um alvo é sempre um objectivo que nos move. Um passo em frente, um salto adiante, um pulo mais alto, um voo mais longe. Avançar é o verbo que sempre se impõe. Desejar. Sonhar. Lutar. Realizar. Por vezes perder. Escorregar. Cair. Sacudir o pó. Reerguer-se. Voltar a acreditar. De novo lutar. Esforço. Fraqueza. Quase desistir. Já falta pouco. Insiste. Se fores capaz de continuar, um dia chegas lá. Um dia hás-de ganhar. O prémio é continuar a ter tempo para fazer e refazer. Toda a vida, por mais longa que seja, será sempre uma obra frustrantemente inacabada. Desliga e volta a ligar. Reinicia o contador e acelera, rumo à próxim

Mandela: longo caminho para a liberdade

"Mandela: long walk to freedom"; Realizador: Justin Chadwick; Protagonistas: Idris Elba (Mandela), Naomi Harris (Winnie). Fui há poucos dias ver este filme que abrevia vinte e sete longos e tortuosos anos de cativeiro em duas horas e meia. E saí da sala de cinema a considerar que o realizador desta película - inspirada na autobiografia homónima de Nelson Mandela, publicada em 1994 - aligeirou demasiado a história. Ainda que seja vincado, quer o isolamento, quer o clima de tortura e humilhação a que Mandela foi submetido na prisão de Robben Island, é fácil abandonar-se a sala com a vontade de querer ver mais, de saber mais, de ler o livro que testemunha, na primeira pessoa, o drama de quem viveu assim: abdicando da sua liberdade em prol da luta pelo direito à igualdade social dos seus semelhantes. A surpresa do filme, para mim, foi a revelação do papel de Winnie ao lado da luta do grande líder. A segunda mulher de Mandela, mãe de duas filhas que cresceram sem ver o pai,

Noite feliz

O espírito acende-se na árvore e aos poucos em cada um de nós. Não há quem lhe seja imune. Gostamos do Natal porque é uma noite sem medo, de ruas e casas muito iluminadas. De estradas desertas e casas lotadas. Uma noite onde até as solidões se confortam de azeite morno derramado no bacalhau. Porque nesta noite até os sem tecto são chamados a sentar-se à mesa diante de um prato quente. Há mais mantas para distribuir e tendas abertas ao convívio dos que se habituaram a chamar cama às pedras da calçada. É a noite mais tranquila de todas as noites porque o mundo, por umas horas, se aquieta e respira. Até os escravos da idade moderna tem ordem para partir em liberdade. Facturam até ao último instante os esquecimentos de alguém e suspiram sonhos quando chega a tão esperada hora de jantar. Os que têm a sorte de sentar-se à mesa, gostam de a ter farta das suas tradições. É a noite do vale tudo, comer e beber e repousar dos sacrifícios passados. Olhar com vagar e descobrir novas rugas nos ro

A desumanização

“A desumanização”, Valter Hugo Mãe, 2013 O que dizer de Valter Hugo Mãe, um escritor que chegou viu e venceu? Se há pessoas que nascem com o dom da palavra, ele foi um deles. Não tem, porém, uma escrita fácil nem consensual. Só um apreciador de belas artes gostará de lê-lo. A escrita de Hugo Mãe roça o surrealismo e causa por vezes estranheza, antes do verdadeiro prazer. Nunca o tinha lido enquanto romancista, confesso. Há muito que sigo as suas crónicas no Jornal de Letras e noutras publicações, apreciando-lhe o estilo: frontal e cristalino, por vezes de uma inocência infantil, sempre a prosar de olho na poética que cada entrelaçar de palavras pode encerrar. A leitura deste seu último romance - “A desumanização” – vem confirmar-me a ideia de que estamos diante de um grande escritor português, com um estilo muito vincado, onde uma obsessiva busca pela literalidade se sobrepõe sempre ao valor da história. Há momentos em que quase esquecemos o conteúdo narrado e nos deleitamos ape

A persistência da memória

“A persistência da memória”, Daniel Oliveira, 2013 Interrompendo um ciclo de leitura de autores premiados, decidi desanuviar com um estreante no romance: Daniel Oliveira. Sobejamente conhecido do pequeno ecrã, este jovem comunicador de trinta e um anos lança-se como romancista com “A persistência da memória” – nome inspirado numa das mais célebres telas surrealistas de Salvador Dali . Neste livro, Camila, a narradora e protagonista da história, sofre de hipermnésia ou síndrome de memória superior, uma patologia que a perturba e afecta, pela impossibilidade de eliminar do pensamento os acontecimentos passados, que lhe perturbam o presente e lhe confundem o futuro. Voando entre Lisboa, Rio de Janeiro e Nova Iorque, a personagem vai-nos revelando os seus segredos – mesmo os mais inconfessáveis – e as passagens mais marcantes da sua vida. Sem nunca roçar o brejeiro, nem recorrer ao vernáculo, o autor descreve com erotismo e subtileza as cenas mais íntimas, conferindo-lhes a dose

Tempo de ser mãe

Ter filhos é inventar tempo. É deixar de conjugar o verbo viver na primeira pessoa do singular. Tu passas a ser mais importante do que eu e a minha felicidade passa a depender do teu bem-estar. Se não estiveres bem, se te pressentir um medo ou uma dor, nada mais me fará sorrir até ser capaz de te aliviar o sofrimento. Por cortesia, os meus desejos cederão o lugar às tuas vontades e só por ti serei capaz de suportar mesmo o insuportável. Aguentar horas de pé a ver-te saltar, saboreando apenas a recompensa do teu riso. Deixar para trás todos os afazeres planeados, só porque me imploras para que vá ao cinema contigo ver o filme que acabou de estrear. Desorganizar-me mentalmente, abdicando do tempo em que deveria estar a sós com o meu pensamento para fazer as pazes com as ideias de futuro que chamam por mim. Permitir-me ser a boneca humana penteada por um arrepio de duas mãos minúsculas movidas a puro amor. O resto pode esperar. O tempo não deixará de correr, mas os outros sonhos têm o