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Mensagens

A mostrar mensagens de novembro, 2019

Onde estás?

Procurei-te em tantas pessoas erradas.  Na sombra dos versos. No avesso dos caminhos. Nas águas onde mergulha o verão. Nas manhãs desertas e nas noites fingidas. Nos bolsos e nas gavetas. Nas multidões anónimas e atrás das portas. Na terra do pecado e no país dos sonhos. Procurei-te e talvez ainda te encontre. Amanhã ou depois. Algures, num lugar sem medo, onde a vontade vence os limites e o desejo abraça quem mais se quer. Em breve, talvez ainda te encontre.

A vida é uma menina que corre

A vida corre. Como corria aquela menina de olhos cor de esperança que adentrava os campos e trepava as árvores. Eram anos duros mas leves, rigorosos mas despreocupados. A menina tinha uma idade na qual não cabiam problemas e o ar puro entrava-lhe a plenos pulmões. Dormia o sono angelical dos pássaros e raiava como um sol ao alvorecer. A escola era uma lonjura solitária calcorreada na alegria inocente de quem nada teme. O mal não existe para quem o desconhece. E aquela menina era uma bondade só. Do campo para a cidade, de Portugal para o estrangeiro, o bom dia virou bonjour e passou a ir à l'école. Cette petite fille cresceu emigrante e regressava princesa aos bailes de Verão. Foi aí que um dia o príncipe a convidou para dançar. Era um jovem rebelde e destemido com aspirações políticas e um encanto singular. Era alto, esguio, calças à boca de sino e cabeleira a condizer com os 70's. Encantada, ela rendeu-se e o coração não parou de crescer desde esse dia. Bateu, bateu, bate

Desvirtualizar

Andamos ocupados demais. Precisamos parar e olhar mais uns para os outros. Todos os dias nos nascem rugas sem que uma carícia as confirme. Não há dia que passe sem que, na imensidão imparável de objetivos e metas, haja um momento no qual nos sentimos irremediavelmente sós. Quantos dias terminamos sem um abraço , sem um desabafo chorado ao ombro, sem uma gargalhada coberta pelos lençóis? Precisamos parar mais, frente a frente, olhos nos olhos, mãos nas mãos, nariz na pele, ofegantes, boca a boca. Desvirtualizar a vida e voltarmos a ser, simplesmente, o que nascemos para ser: humanos.

Domingos idosos

Passos vagarosos arrastam-se pelas margens da vida, nas tardes litorais de domingo. Nada os consegue apressar, na secreta esperança de chegarem atrasados ao fim do tempo. Vão de braços entrelaçados, bengalas humanas uns dos outros, contando a miudeza das pegadas invisíveis. Nas breves tardes que espreitam o inverno, o sol hiberna e o peso dos agasalhos, somado à idade, sobrecarrega quem já nada pode. Nos rostos, destinos desenhados a dor. E no olhar, apenas o mar, na serenidade acabada de beber. À espera de uma ordem divina, morte certa por marcação, continuam na incerteza do caminho, com a garantia de que o futuro será beco sem saída.