Por mais que tentemos, que arrisquemos, que nos esforcemos com
intensidade, ano após ano, há sonhos que insistem em não se realizar. Neste
dia, repetidamente, ano após ano, é tempo balanços. Como numa empresa, apuramos
o saldo final. O que ganhei? O que perdi? Onde falhei? O que aprendi? O que
fazer para melhorar na saúde, no amor, na prosperidade? Quantas vezes terei
mais de falhar até conseguir realizar-me? Este dia, que levanta todas as
dúvidas que nos cobrem a existência, não nos oferece respostas. Apenas
promessas vãs de esperança em dias melhores que estão sempre por vir, mesmo que
nunca cheguem. O dia 31 de dezembro é um lugar utópico, algures entre o céu e o
inferno, onde livremente nos é permitido sonhar. É dia de despejar lixos,
arrumar gavetas, fechar portas, abrir janelas. É hora de dar a mão aos que
queremos transportar connosco para o novo ano e de deixar partir os que já não
têm espaço para habitar em nós. É também tempo de gratidão. De louvar
cada experiência, cada pessoa que nos cruzou o caminho, até mesmo as que nos
fizeram crescer por intermédio da dor. Que a viragem do calendário seja mais
que um mero mudar de página, trazendo resoluções efetivas a tudo o que nos
aflige. Que novos tempos nos revelem novos horizontes, permitindo-nos voltar a
planear e sonhar sem limites.
Dizem-me frequentemente que ainda tenho cara de menina, que ainda sou nova, que ainda tenho a vida à minha frente. Contudo, face à cronologia, é-me inevitável constatar que mais de metade do tempo que me foi concedido já passou. O que me resta já será provavelmente menos. Se isso me inquieta? Não em termos de medo, mais em termos de pressa. Já não é pressa de viver mas de realizar, de me realizar. Apesar de já ter plantado árvores, tido filhos e publicado livros, sinto-me ainda distante da potencialidade plena do meu propósito existencial. O que me falta realizar então? Talvez plantar mais árvores e escrever mais livros, já que a possibilidade de gerar filhos tem prazo de validade e a energia vital para os cuidar vai esmorecendo. Tudo o que me falta fazer parece-me tanto para o tempo que imagino à minha frente. Não cabem tantos livros e filmes e viagens e experiências nas décadas que imagino ainda poder viver. O meu maior conflito interior neste momento é já não ser nova para tanta coi...
Comentários
Enviar um comentário
Se gostou deste artigo, ou tem uma palavra a acrescentar, agradeço imenso que deixe o seu comentário.