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Os gatos não têm vertigens

"Os gatos não têm vertigens", António Pedro Vasconcelos,
2014, 124 minutos
Um grande filme. Um dos melhores do cinema português a que assisti nos últimos anos. Repleto de emoções fortes do princípio ao fim, sem nunca se aproximar do lamechas. A lágrima só nos vence pela beleza das mensagens. Uma improvável história de amizade nascida entre uma viúva solitária e um jovem delinquente que nunca conheceu o amor de pai nem mãe. Um encontro feliz gerado pelos acasos menos bons da vida. Antes de se tornar o melhor amigo de Rosa (Maria do Céu Guerra), Jó (João Jesus) descobre no terraço do seu prédio a vista mais bonita de Lisboa. Uma paisagem que o inspira a desabafar com o papel os infortúnios dos seus dezoito anos, marcados pelo abandono da mãe e pelos maus tratos do pai alcoólico. Por nunca ter conhecido o bem-querer, é com desconfiança que Jó recebe sempre o amor fraterno de Rosa. “Porque é que me tratas bem?”, questiona-a,  depois de já a ter roubado. Todos precisamos de alguém. Esta é a lição maior que nos fica. No fundo, somos todos gatos em busca de um telhado firme onde possamos adormecer em segurança. Sem querer adiantar muito, o reencontro final entre o falecido marido (Nicolau Breyner) e Rosa é capaz de tocar até os mais insensíveis. Ao som do tema “Clandestinos do Amor”, de Ana Moura, o casal troca juras eternas: “Um instante sem ti é uma eternidade”. Candidato português aos espanhóis Goya, “Os gatos não têm vertigens”, de António Pedro Vasconcelos, merece ser visto e premiado.

Oiça o tema "Clandestinos do Amor"


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