O medo quase me travou. À última, estive para não ir. Temia o
portão fechado, numa rejeição inventada à pressa. Sem avisares que me
esperavas, receavas que eu já não fosse. Mas eu fui e tu estavas lá, de portas
escancaradas, à minha espera. Debaixo do mesmo tecto enfim, deixámos o mundo
lá fora e sorrimos. Do nosso olhar aceso, fez-se luz. Conversas iluminadas
revelaram que sonhamos a cores o mesmo sonho. Um dia, ainda havemos de comer
pipocas de pantufas e caminhar pela praia ao luar. Hoje, trocando beijos por
palavras, disseste: “Para mim, és perfeita!”. E eu, de coração a galope, recebi
esse teu presente, na esperança de desembrulhar o futuro.
Dizem-me frequentemente que ainda tenho cara de menina, que ainda sou nova, que ainda tenho a vida à minha frente. Contudo, face à cronologia, é-me inevitável constatar que mais de metade do tempo que me foi concedido já passou. O que me resta já será provavelmente menos. Se isso me inquieta? Não em termos de medo, mais em termos de pressa. Já não é pressa de viver mas de realizar, de me realizar. Apesar de já ter plantado árvores, tido filhos e publicado livros, sinto-me ainda distante da potencialidade plena do meu propósito existencial. O que me falta realizar então? Talvez plantar mais árvores e escrever mais livros, já que a possibilidade de gerar filhos tem prazo de validade e a energia vital para os cuidar vai esmorecendo. Tudo o que me falta fazer parece-me tanto para o tempo que imagino à minha frente. Não cabem tantos livros e filmes e viagens e experiências nas décadas que imagino ainda poder viver. O meu maior conflito interior neste momento é já não ser nova para tanta coi...

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