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Um prédio amarelo

Vivo no quarto andar de um prédio amarelo.
São quatro andares vezes dois lados, esquerdo e direito.
Além da porta ao lado, onde nunca bati, existem mais oito portas onde se escondem umas dezenas de perfeitos desconhecidos.
Já vislumbrei alguns rostos de soslaio, por entre uma e outra viagem de elevador.
Elevador acima, escada abaixo, a porta da rua é o único ponto de encontro destes anónimos que fazem questão de não se dar a conhecer.
Já ouvi o choro de crianças. Alguns devem ter filhos. Mas a minha filha não tem amigos. Eles não saem da toca para brincar.
O meu prédio amarelo é um aglomerado de gavetas onde as pessoas se escondem quando voltam do trabalho. Comem, dormem e voltam a sair. Sem tempo nem vontade para se conhecer.
E os dias passam e nada muda. Vejo roupa estendida. Oiço-os furar paredes e aspirar o chão. Suspeito que mora lá alguém.
Tenho vizinhos mas não tenho amigos, no meu prédio amarelo.
Para compensar, consigo ver o mar. Lá ao longe, o farol acena-me de noite, como se me quisesse falar.
Se pudesse dir-me-ia: "Não fiques triste, logo logo o Verão voltará de férias".
É bonito o meu prédio amarelo com vista para o mar, onde me escondo da noite e acordo para o dia, dia após dia.

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