No dia 25 de Abril de 1974, eu ainda não estava. Por
isso, não vou contar o que não vivi. Prefiro antes revelar o que sonho e sinto.
Sonho com uma realidade evoluída, onde ninguém tenha de trabalhar com o esforço
de um atleta olímpico para ser remunerado como um amador. Sonho com uma
esperança de berço: que cada bebé que nasça seja um cérebro útil ao serviço do
seu país. Porque, a cada geração que passa, os filhos vão sendo cada vez
melhores que os pais, ou não fosse esse o objectivo único da humanidade. Nascer,
aprender, melhorar e passar o testemunho. Sonho com uma geração que não sinta o
dia 25 como se fosse o 35 de cada mês. Que não haja mais mês que salário, muito
pelo contrário! Que o trabalho tenha um preço justo e adequado ao saber fazer
de cada um. Sonho com um país que - como li algures há dias - deixe de fazer
famosa tanta gente estúpida, remetendo ao anonimato os que realmente conquistam
feitos geniais. Enfim, perdoem-me o desabafo de meia-noite, mas é o que sonho e sinto. E não
minto. Tenho quase 35 quando passam 40 anos da revolução dos cravos. E
apetece-me, pela calada da noite, lançar um repto à minha geração (à rasca): para quando a revolução
dos (es)cravos? Temos o dever de ser melhores que os nossos pais!
Dizem-me frequentemente que ainda tenho cara de menina, que ainda sou nova, que ainda tenho a vida à minha frente. Contudo, face à cronologia, é-me inevitável constatar que mais de metade do tempo que me foi concedido já passou. O que me resta já será provavelmente menos. Se isso me inquieta? Não em termos de medo, mais em termos de pressa. Já não é pressa de viver mas de realizar, de me realizar. Apesar de já ter plantado árvores, tido filhos e publicado livros, sinto-me ainda distante da potencialidade plena do meu propósito existencial. O que me falta realizar então? Talvez plantar mais árvores e escrever mais livros, já que a possibilidade de gerar filhos tem prazo de validade e a energia vital para os cuidar vai esmorecendo. Tudo o que me falta fazer parece-me tanto para o tempo que imagino à minha frente. Não cabem tantos livros e filmes e viagens e experiências nas décadas que imagino ainda poder viver. O meu maior conflito interior neste momento é já não ser nova para tanta coi...

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