Ter filhos é inventar tempo. É deixar de conjugar o verbo viver na primeira pessoa do singular. Tu passas a ser mais importante do que eu e a minha felicidade passa a depender do teu bem-estar. Se não estiveres bem, se te pressentir um medo ou uma dor, nada mais me fará sorrir até ser capaz de te aliviar o sofrimento. Por cortesia, os meus desejos cederão o lugar às tuas vontades e só por ti serei capaz de suportar mesmo o insuportável. Aguentar horas de pé a ver-te saltar, saboreando apenas a recompensa do teu riso. Deixar para trás todos os afazeres planeados, só porque me imploras para que vá ao cinema contigo ver o filme que acabou de estrear. Desorganizar-me mentalmente, abdicando do tempo em que deveria estar a sós com o meu pensamento para fazer as pazes com as ideias de futuro que chamam por mim. Permitir-me ser a boneca humana penteada por um arrepio de duas mãos minúsculas movidas a puro amor. O resto pode esperar. O tempo não deixará de correr, mas os outros sonhos têm o dever de esperar por este. Porque ser mãe é uma missão a que um dia me propus. De mim nasceu a mais perfeita de todas as obras que um ser humano pode conceber. Talvez a única para a qual a falta de tempo não tenha jamais perdão.
Dizem-me frequentemente que ainda tenho cara de menina, que ainda sou nova, que ainda tenho a vida à minha frente. Contudo, face à cronologia, é-me inevitável constatar que mais de metade do tempo que me foi concedido já passou. O que me resta já será provavelmente menos. Se isso me inquieta? Não em termos de medo, mais em termos de pressa. Já não é pressa de viver mas de realizar, de me realizar. Apesar de já ter plantado árvores, tido filhos e publicado livros, sinto-me ainda distante da potencialidade plena do meu propósito existencial. O que me falta realizar então? Talvez plantar mais árvores e escrever mais livros, já que a possibilidade de gerar filhos tem prazo de validade e a energia vital para os cuidar vai esmorecendo. Tudo o que me falta fazer parece-me tanto para o tempo que imagino à minha frente. Não cabem tantos livros e filmes e viagens e experiências nas décadas que imagino ainda poder viver. O meu maior conflito interior neste momento é já não ser nova para tanta coi...

Lindo Cláudia!
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